A raposa e o frango
(Foto: Marcelo Camargo Ag. Brasil)
“Nunca, antes,
na história deste País”, diria o Lula se capacidade crítica tivesse, foram
cometidos tantos deslizes e desatinos seguidos, rapidamente transformados em
graves crimes contra a Administração Pública e imenso escândalo que abalou a
República, como no episódio palaciano que envolveu o ex-deputado Geddel Vieira
Lima e o diplomata Marcelo Calero.
Eis a minha
visão do caso, com base, exclusivamente, no depoimento integral do ex-ministro
da Cultura Marcelo Calero à Polícia Federal – PF, feita a 19 de novembro, ao qual tive acesso, e às
falas de Geddel e Calero à mídia e, mais, as declarações oficiais do Senhor
Presidente da República. Ignoro, não considero as impressões, comentários,
opiniões e críticas de jornalistas, parlamentares, outros Ministros do Governo
e terceiros, sejam estes últimos pacificadores ou incendiários, voluntariosos
ou complacentes.
Não críveis,
imprevisíveis, a ingenuidade e o erro repetido e contumaz, logo constituído em crime
de Advocacia Administrativa (Art. 321 do Código Penal - CP), do ex-ministro da
Secretaria-Geral da Presidência da República, Geddel Vieira Lima, em insistir
num pleito pessoal, particular, se valendo de uma função pública na qual estava
investido, pressionando um colega de Ministério e ameaçando-o, caso não fosse
atendido.
Geddel
comprara, na planta, um apartamento em um prédio de trinta pavimentos em
Salvador, Bahia, numa área onde quase todos os imóveis são tombados. O projeto
da obra fora aprovado pela Superintendência do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional – IPHAN na Bahia, mas, em seguida, questionada
pela Presidência Nacional do órgão em Brasília, é embargada, por ferir o
contexto urbano colonial e o patrimônio paisagístico da capital baiana, autorizando-se,
posteriormente, apenas a construção de treze andares do edifício. Geddel, a
princípio, agiu pelos canais normais, através de advogado, junto ao IPHAN, em
defesa de seu interesse contrariado. Mas, depois, constatando que a decisão do
IPHAN, ouvida a Procuradoria do órgão, que foi pela redução do número de
andares do prédio, preferiu, valendo-se do seu poder político, atuar pessoal e
agressivamente, em causa própria, abordando, questionando e desafiando o então
Ministro da Cultura, ao qual o IPHAN é subordinado. Chegou a dizer a Calero que
ele deveria “enquadrar” a Presidente do IPHAN, Kátia Bogéa, que “pediria a cabeça
dela, indo falar até com o Presidente da República”.
Por outro
lado, ficou evidente a incipiência política e fragilidade administrativa de
Calero, que não se portou com a altivez e autoridade de um Ministro de Estado.
Mesmo respaldado pelo Presidente da República, não foi firme em manter a posição
legalista, não se impôs, como era do seu dever e direito, não resistiu enfim, se
desestabilizou emocionalmente e pediu demissão diante de um impasse que ele não
criou e no qual agia correta e republicanamente, mesmo de maneira tíbia e
juvenil.
A fotografia:
uma velha raposa cometendo um crime e um frango, blindado pelo seu cargo, com o
mesmo poder institucional da raposa, em pânico, apesar de prestigiado pelo raposão, o Presidente, chefe da raposa e
do frango, porém, este, com a inexperiência de um adolescente inseguro. A princípio,
não se confunda, aqui, qualquer pedido político, lícito e legal, de conotações
políticas ou feito por um político, de interesse pessoal, grupal ou social, com
prática de Advocacia Administrativa. Nada há nada de errado ou criminoso um
ministro solicitar informações, orientação, ou um roteiro para revisão de uma
decisão administrativa a um colega, sobre qualquer questão, mesmo que ela seja
privada (e, normalmente, é dirigida ao mundo privado), a ser decidida por um
órgão público.
Porém, quando
a abordagem de Geddel sobre Calero é autoritária, ameaçando-o, tentando
subalternizá-lo e levá-lo a uma decisão sem sustentação legal, que lhe agrada,
FORA DA LEI, contrariando os protocolos administrativos recursais, regulares, aí deixamos a normalidade e caímos na delinquência.
Tudo começa
com um erro primário, indevido e tolo, de Geddel que, desinformado e sem
intermediário confiável, procura um colega de Ministério para pedir um “favor”,
o cancelamento ou uma revisão de um ato administrativo, de um órgão subordinado
àquele colega, no qual tinha interesse pessoal, particular. É lógico que esse “favor”
teria de cumprir todas as exigências legais, normativas. Ou a procura um colega
de Ministério para ser seu cúmplice ou comparsa na prática de um crime de Advocacia
Administrativa, uma pessoa que, além de reta e incorruptível, não era, e nunca
foi, seu amigo ou pessoa de suas relações, o ex-ministro Calero.
Em minha vida,
conheci na infância e juventude líderes brilhantes, e, depois, como servidor
público, trabalhei com homens públicos admiráveis, probos, políticos de
coturno, integérrimos. E, também, com alguns medíocres, negocistas e
desprezíveis. Um pedido desse jaez é comum, não apenas em ambientes políticos e
públicos, mas em qualquer setor da atividade humana. Senador ou deputado
solicitar a um ministro, a uma secretaria ou departamento, de qualquer nível,
ou a um presidente de estatal, uma “atenção especial”, “examinar com carinho o
processo”, “uma orientação”, “atentar para as minhas razões ou argumentos”,
“apelar para a sua sensibilidade e reconhecida competência” etc. etc. – tudo
isto é comum, rotineiro. Tudo dentro da
Lei, ressalte-se, sem vantagens ou privilégios de qualquer espécie ou dimensão.
São “rezas” comuns e rotineiras no mundo político. E também na esfera privada.
Presencialmente, por telefone, por e-mail, carta, bilhete, whatsapp. Qualquer cidadão, seja qual for o seu status ou esfera
social, política, econômica ou cultural, ministro ou vendedor de cartão de
telefone, pode tanto peticionar, requerer informações, revisões, recorrer, bem como
agir como descrevi acima, formal ou informalmente. Formalmente é garantia
constitucional.
O
desarrazoado, o desinteligente, imprudente, absurdo, criminoso, é, uma
autoridade pública, valendo-se do cargo,
além de pugnar pelo ilegal, pelo “jeitinho brasileiro”, irregular, insólito, requerer
ilicitude, pressionar, chantagear,
ameaçar. Se alguém assim proceder, configura-se, além de Delito Ético e Corrupção,
o crime de “Advocacia Administrativa”. Geddel ameaça, direta e indiretamente, Calero,
segundo o depoimento do ex-ministro da Cultura à PF, até com a demissão da
Superintendente do IPHAN na Bahia, se o parecer do IPHAN nacional fosse mantido.
A prática,
quando legítima, lícita, justificada, legal, normalmente é informal,
corriqueira. Mas pode ser formal, cerimoniosa. Equivale, por analogia, se
viajarmos a outro território, o Judiciário, por exemplo, quando um advogado entrega
no gabinete de um juiz, desembargador ou ministro de tribunal um memorial, acerca
de uma causa que defende. Nada há de criminoso ou escandaloso num ato dessa
natureza, contanto que seja respeitoso, lícito, de caráter legítimo e com
objetivos lícitos. Também nada há de antiético ou criminoso, a verdadeira ação
de lobby, regulamentada e comum em
vários países, quando empresa, setor, partido político ou corporação procura
núcleos decisórios, em qualquer dos poderes do Estado, e tenta influir na
análise e conclusão a seu favor, através da argumentação, da persuasão e do
convencimento da autoridade pública ou executivo privado acerca de questão que
esteja submetida a seu encaminhamento ou decisão.
RESUMO DA ÓPERA – PERSONAGENS, ATUAÇÕES E
EXPECTATIVAS
Geddel Vieira Lima – Analisando-se o
depoimento de Calero à PF, as próprias entrevistas dele à mídia e gravações
telefônicas que o ex-ministro da Cultura promoveu, o ex-ministro da Secretaria
de Governo da Presidência da República, pode-se inferir que ele transgrediu a Ética
Pública e cometeu crime de Advocacia Administrativa (Arts. 321 do CP). Pediu demissão no dia 25 de novembro, seis dias após o depoimento de Calero à PF.
Marcelo Calero – Suas declarações dão
conta de que agiu corretamente, dentro da Lei e das normas aplicáveis pelo
IPHAN, não aceitando a influência de Geddel para liberação da obra. Porém
abateu-se e se transtornou. Apresentou-se ao Presidente e à sociedade como uma pessoa
acuada com as insistentes ameaças de Geddel. Especificamente, no imbróglio, no
confronto com Geddel, na sua condição de Ministro da Cultura, foi fraco,
inexperiente, juvenil, menor. Entretanto, no processo, no âmbito do MinC, foi
ético, competente, correto, teve conduta administrativa e jurídica perfeitas. Acertou
ao recepcionar, integralmente, o parecer técnico da Procuradoria do IPHAN que
analisou o recurso de Geddel, recomendando a diminuição da altura do prédio,
decidindo em definitivo sobre o mérito.
Ao final do primeiro
encontro com Temer, que tratou do assunto “Geddel”, o Presidente o tranquilizou
sobre a decisão que deveria comunicar ao Chefe da Secretaria, que seria baseada
em parecer técnico, “infelizmente não sendo possível atendê-lo”, acresceu o
Presidente. E ponto final. Num segundo encontro, quando Temer lhe sugeriu a
construção de uma saída, Calero, insolitamente, “sentiu-se bastante desapontado,
uma vez que ‘foi advertido’ (? – apóstrofo e interrogação minha), em razão de
ter agido sem cometer qualquer tipo de irregularidade; e sentiu-se ‘decepcionado’
(?- outro apóstrofo e interrogação minha) também pelo fato de não ter mais a
quem reportar-se a fim de solucionar esta situação, uma vez que o próprio Temer
o havia ‘enquadrado’ (? – terceiro apóstrofo e interrogação minha)”. O Presidente
não o desapontou, não o advertiu nem o enquadrou, entendimentos completamente
equivocados.
Afinal, Calero
disse à PF que, então, sua única saída foi apresentar seu pedido de demissão, que ocorreu a 18 de novembro.
Quanto às
gravações que Calero fez dos seus diálogos com Geddel e Padilha, não são usuais
entre os membros de um Ministério, mas, compreensíveis, pelas circunstâncias.
Quanto à única gravação que fez da conversa de Temer com ele, também
telefônica, ironicamente a última, que ele a considerou “protocolar”, como comprovadamente
o foi, julgo-a sem qualificação moral. Em minha opinião, lamentável, indigna, para não
dizer ignominiosa,
Jurema Machado – Presidente Nacional do
IPHAN que embargou o empreendimento La
vie Ladeira da Barra, prédio onde Geddel comprou o apartamento.
Kátia Bogéa – Presidente que substituiu
Jurema, recebeu os advogados de Geddel, recepcionou o recurso pela revisão do
embargo, pois constatou que não houve contraditório no processo administrativo,
direito de defesa de Geddel. Encaminhou os autos para apreciação da
Procuradoria do IPHAN, que decidiu pela redução do gabarito.
Eliseu Padilha – Ministro-Chefe da Casa
Civil, inicialmente disse a Calero que, se “a questão estava judicializada, não
deveria haver decisão administrativa definitiva a respeito”. Em seguida, “que
tentasse construir uma saída com a AGU” - Advocacia Geral da União. Depois, passou a impressão a Calero
que desejava preservá-lo no cargo e, mais tarde, perguntou a Calero como Geddel
poderia recorrer da decisão do mérito exarada pelo Ministro da Cultura.
Gustavo Rocha – Secretário de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, perguntou se Calero já havia enviado o processo à AGU, insistiu nessa proposta e, por fim, se apresentou, como autorizado pelo Presidente da República, a repetir, pela terceira vez, a pergunta, mesmo depois que Calero comunicou a Temer que não iria mais atuar no processo. Comunicou a Calero que ingressara com um recurso junto à Presidência do IPHAN para reformar a decisão do Ministro da Cultura.
Procuradoria e Procuradores do MinC – A
Procuradoria decidiu o recurso de Geddel pela redução do gabarito do prédio. Os
procuradores foram chamados à AGU, quando esta considerava que Calero lhe
enviara o processo, o que não ocorreu.
Nara de Deus – Chefe de Gabinete de
Temer, solidarizou-se, informalmente, com a postura legalista de Calero.
Carlos Henrique Sobral – Chefe de
Gabinete de Padilha, figurante sem relevância, que apenas interrogou Calero
sobre o prazo recursal que cabia a Geddel.
Grace Mendonça – Ministra-Chefe da AGU,
que não chegou a atuar no processo.
Michel Temer – Inicialmente,
tranqüilizou Calero, aconselhando-o a responder a Geddel que, por razões
técnicas, não foi possível atendê-lo. Mas, num seguindo encontro, disse a
Calero que a sua decisão estaria criando “dificuldades operacionais” em seu
Gabinete. Recomendou-lhe, então, que tentasse construir uma saída para que o
processo fosse encaminhado à AGU, porque a Ministra Grace Mendonça teria uma
solução. Em outra oportunidade, tentando aplacar a ansiedade, impaciência e a
intolerância de Calero quanto a pressões que estava sofrendo, justificou,
apascentando-o: “... a Política tinha dessas coisas, esse tipo de pressão”.
Calero sentiu-se “desapontado” (SIC) e depois recebeu os acautelamentos de
Temer como se este o tivesse “enquadrado” (SIC). Em minha opinião, pura
insegurança púbere e pretexto para deixar o cargo. No mesmo dia, no início da
noite, presencialmente, disse ao Presidente que “estava se demitindo”, no que o
Presidente tentou demovê-lo da atitude. No dia seguinte, 18 de novembro,
recebeu ligação de Calero dizendo que “entregaria o seu cargo”. Temer, mais uma
vez, lhe disse que não “via razões para isto”, mas Calero retrucou dizendo que
“as teria”. E tudo foi consumado. A cortina se fecha.
MEU JULGAMENTO: Não houve crime comum
ou crime de responsabilidade de Temer. O Presidente, apenas, tentou dirimir,
promover um entendimento entre dois de seus ministros, mesmo que o interesse de
uma das partes fosse privado, particular. O Presidente nada arbitrou, porque
nada falou, encaminhou ou decidiu no processo, inclusive sugeriu a Calero o
socorro da AGU, que é um órgão, não apenas de defesa de interesse da União, mas
de assessoramento e aconselhamento jurídico do Presidente (Decreto nº 7.392, de 13.12.2010).
COM A PALAVRA, A COMISSÃO DE ÉTICA PÚBLICA
DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, A POLÍCIA FEDERAL E
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
E, CLARO, O SEU COMENTÁRIO DE INTERNAUTA QUE
VISITA ESTE BLOG. SEU E-MAIL NÃO SERÁ PUBLICADO.
A raposa e o frango (Foto: Marcelo Camargo Ag. Brasil) |
“Nunca, antes,
na história deste País”, diria o Lula se capacidade crítica tivesse, foram
cometidos tantos deslizes e desatinos seguidos, rapidamente transformados em
graves crimes contra a Administração Pública e imenso escândalo que abalou a
República, como no episódio palaciano que envolveu o ex-deputado Geddel Vieira
Lima e o diplomata Marcelo Calero.
Eis a minha
visão do caso, com base, exclusivamente, no depoimento integral do ex-ministro
da Cultura Marcelo Calero à Polícia Federal – PF, feita a 19 de novembro, ao qual tive acesso, e às
falas de Geddel e Calero à mídia e, mais, as declarações oficiais do Senhor
Presidente da República. Ignoro, não considero as impressões, comentários,
opiniões e críticas de jornalistas, parlamentares, outros Ministros do Governo
e terceiros, sejam estes últimos pacificadores ou incendiários, voluntariosos
ou complacentes.
Não críveis,
imprevisíveis, a ingenuidade e o erro repetido e contumaz, logo constituído em crime
de Advocacia Administrativa (Art. 321 do Código Penal - CP), do ex-ministro da
Secretaria-Geral da Presidência da República, Geddel Vieira Lima, em insistir
num pleito pessoal, particular, se valendo de uma função pública na qual estava
investido, pressionando um colega de Ministério e ameaçando-o, caso não fosse
atendido.
Geddel
comprara, na planta, um apartamento em um prédio de trinta pavimentos em
Salvador, Bahia, numa área onde quase todos os imóveis são tombados. O projeto
da obra fora aprovado pela Superintendência do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional – IPHAN na Bahia, mas, em seguida, questionada
pela Presidência Nacional do órgão em Brasília, é embargada, por ferir o
contexto urbano colonial e o patrimônio paisagístico da capital baiana, autorizando-se,
posteriormente, apenas a construção de treze andares do edifício. Geddel, a
princípio, agiu pelos canais normais, através de advogado, junto ao IPHAN, em
defesa de seu interesse contrariado. Mas, depois, constatando que a decisão do
IPHAN, ouvida a Procuradoria do órgão, que foi pela redução do número de
andares do prédio, preferiu, valendo-se do seu poder político, atuar pessoal e
agressivamente, em causa própria, abordando, questionando e desafiando o então
Ministro da Cultura, ao qual o IPHAN é subordinado. Chegou a dizer a Calero que
ele deveria “enquadrar” a Presidente do IPHAN, Kátia Bogéa, que “pediria a cabeça
dela, indo falar até com o Presidente da República”.
Por outro
lado, ficou evidente a incipiência política e fragilidade administrativa de
Calero, que não se portou com a altivez e autoridade de um Ministro de Estado.
Mesmo respaldado pelo Presidente da República, não foi firme em manter a posição
legalista, não se impôs, como era do seu dever e direito, não resistiu enfim, se
desestabilizou emocionalmente e pediu demissão diante de um impasse que ele não
criou e no qual agia correta e republicanamente, mesmo de maneira tíbia e
juvenil.
A fotografia:
uma velha raposa cometendo um crime e um frango, blindado pelo seu cargo, com o
mesmo poder institucional da raposa, em pânico, apesar de prestigiado pelo raposão, o Presidente, chefe da raposa e
do frango, porém, este, com a inexperiência de um adolescente inseguro. A princípio,
não se confunda, aqui, qualquer pedido político, lícito e legal, de conotações
políticas ou feito por um político, de interesse pessoal, grupal ou social, com
prática de Advocacia Administrativa. Nada há nada de errado ou criminoso um
ministro solicitar informações, orientação, ou um roteiro para revisão de uma
decisão administrativa a um colega, sobre qualquer questão, mesmo que ela seja
privada (e, normalmente, é dirigida ao mundo privado), a ser decidida por um
órgão público.
Porém, quando
a abordagem de Geddel sobre Calero é autoritária, ameaçando-o, tentando
subalternizá-lo e levá-lo a uma decisão sem sustentação legal, que lhe agrada,
FORA DA LEI, contrariando os protocolos administrativos recursais, regulares, aí deixamos a normalidade e caímos na delinquência.
Tudo começa
com um erro primário, indevido e tolo, de Geddel que, desinformado e sem
intermediário confiável, procura um colega de Ministério para pedir um “favor”,
o cancelamento ou uma revisão de um ato administrativo, de um órgão subordinado
àquele colega, no qual tinha interesse pessoal, particular. É lógico que esse “favor”
teria de cumprir todas as exigências legais, normativas. Ou a procura um colega
de Ministério para ser seu cúmplice ou comparsa na prática de um crime de Advocacia
Administrativa, uma pessoa que, além de reta e incorruptível, não era, e nunca
foi, seu amigo ou pessoa de suas relações, o ex-ministro Calero.
Em minha vida,
conheci na infância e juventude líderes brilhantes, e, depois, como servidor
público, trabalhei com homens públicos admiráveis, probos, políticos de
coturno, integérrimos. E, também, com alguns medíocres, negocistas e
desprezíveis. Um pedido desse jaez é comum, não apenas em ambientes políticos e
públicos, mas em qualquer setor da atividade humana. Senador ou deputado
solicitar a um ministro, a uma secretaria ou departamento, de qualquer nível,
ou a um presidente de estatal, uma “atenção especial”, “examinar com carinho o
processo”, “uma orientação”, “atentar para as minhas razões ou argumentos”,
“apelar para a sua sensibilidade e reconhecida competência” etc. etc. – tudo
isto é comum, rotineiro. Tudo dentro da
Lei, ressalte-se, sem vantagens ou privilégios de qualquer espécie ou dimensão.
São “rezas” comuns e rotineiras no mundo político. E também na esfera privada.
Presencialmente, por telefone, por e-mail, carta, bilhete, whatsapp. Qualquer cidadão, seja qual for o seu status ou esfera
social, política, econômica ou cultural, ministro ou vendedor de cartão de
telefone, pode tanto peticionar, requerer informações, revisões, recorrer, bem como
agir como descrevi acima, formal ou informalmente. Formalmente é garantia
constitucional.
O
desarrazoado, o desinteligente, imprudente, absurdo, criminoso, é, uma
autoridade pública, valendo-se do cargo,
além de pugnar pelo ilegal, pelo “jeitinho brasileiro”, irregular, insólito, requerer
ilicitude, pressionar, chantagear,
ameaçar. Se alguém assim proceder, configura-se, além de Delito Ético e Corrupção,
o crime de “Advocacia Administrativa”. Geddel ameaça, direta e indiretamente, Calero,
segundo o depoimento do ex-ministro da Cultura à PF, até com a demissão da
Superintendente do IPHAN na Bahia, se o parecer do IPHAN nacional fosse mantido.
A prática,
quando legítima, lícita, justificada, legal, normalmente é informal,
corriqueira. Mas pode ser formal, cerimoniosa. Equivale, por analogia, se
viajarmos a outro território, o Judiciário, por exemplo, quando um advogado entrega
no gabinete de um juiz, desembargador ou ministro de tribunal um memorial, acerca
de uma causa que defende. Nada há de criminoso ou escandaloso num ato dessa
natureza, contanto que seja respeitoso, lícito, de caráter legítimo e com
objetivos lícitos. Também nada há de antiético ou criminoso, a verdadeira ação
de lobby, regulamentada e comum em
vários países, quando empresa, setor, partido político ou corporação procura
núcleos decisórios, em qualquer dos poderes do Estado, e tenta influir na
análise e conclusão a seu favor, através da argumentação, da persuasão e do
convencimento da autoridade pública ou executivo privado acerca de questão que
esteja submetida a seu encaminhamento ou decisão.
RESUMO DA ÓPERA – PERSONAGENS, ATUAÇÕES E
EXPECTATIVAS
Geddel Vieira Lima – Analisando-se o
depoimento de Calero à PF, as próprias entrevistas dele à mídia e gravações
telefônicas que o ex-ministro da Cultura promoveu, o ex-ministro da Secretaria
de Governo da Presidência da República, pode-se inferir que ele transgrediu a Ética
Pública e cometeu crime de Advocacia Administrativa (Arts. 321 do CP). Pediu demissão no dia 25 de novembro, seis dias após o depoimento de Calero à PF.
Marcelo Calero – Suas declarações dão
conta de que agiu corretamente, dentro da Lei e das normas aplicáveis pelo
IPHAN, não aceitando a influência de Geddel para liberação da obra. Porém
abateu-se e se transtornou. Apresentou-se ao Presidente e à sociedade como uma pessoa
acuada com as insistentes ameaças de Geddel. Especificamente, no imbróglio, no
confronto com Geddel, na sua condição de Ministro da Cultura, foi fraco,
inexperiente, juvenil, menor. Entretanto, no processo, no âmbito do MinC, foi
ético, competente, correto, teve conduta administrativa e jurídica perfeitas. Acertou
ao recepcionar, integralmente, o parecer técnico da Procuradoria do IPHAN que
analisou o recurso de Geddel, recomendando a diminuição da altura do prédio,
decidindo em definitivo sobre o mérito.
Ao final do primeiro
encontro com Temer, que tratou do assunto “Geddel”, o Presidente o tranquilizou
sobre a decisão que deveria comunicar ao Chefe da Secretaria, que seria baseada
em parecer técnico, “infelizmente não sendo possível atendê-lo”, acresceu o
Presidente. E ponto final. Num segundo encontro, quando Temer lhe sugeriu a
construção de uma saída, Calero, insolitamente, “sentiu-se bastante desapontado,
uma vez que ‘foi advertido’ (? – apóstrofo e interrogação minha), em razão de
ter agido sem cometer qualquer tipo de irregularidade; e sentiu-se ‘decepcionado’
(?- outro apóstrofo e interrogação minha) também pelo fato de não ter mais a
quem reportar-se a fim de solucionar esta situação, uma vez que o próprio Temer
o havia ‘enquadrado’ (? – terceiro apóstrofo e interrogação minha)”. O Presidente
não o desapontou, não o advertiu nem o enquadrou, entendimentos completamente
equivocados.
Afinal, Calero
disse à PF que, então, sua única saída foi apresentar seu pedido de demissão, que ocorreu a 18 de novembro.
Quanto às
gravações que Calero fez dos seus diálogos com Geddel e Padilha, não são usuais
entre os membros de um Ministério, mas, compreensíveis, pelas circunstâncias.
Quanto à única gravação que fez da conversa de Temer com ele, também
telefônica, ironicamente a última, que ele a considerou “protocolar”, como comprovadamente
o foi, julgo-a sem qualificação moral. Em minha opinião, lamentável, indigna, para não
dizer ignominiosa,
Jurema Machado – Presidente Nacional do
IPHAN que embargou o empreendimento La
vie Ladeira da Barra, prédio onde Geddel comprou o apartamento.
Kátia Bogéa – Presidente que substituiu
Jurema, recebeu os advogados de Geddel, recepcionou o recurso pela revisão do
embargo, pois constatou que não houve contraditório no processo administrativo,
direito de defesa de Geddel. Encaminhou os autos para apreciação da
Procuradoria do IPHAN, que decidiu pela redução do gabarito.
Eliseu Padilha – Ministro-Chefe da Casa
Civil, inicialmente disse a Calero que, se “a questão estava judicializada, não
deveria haver decisão administrativa definitiva a respeito”. Em seguida, “que
tentasse construir uma saída com a AGU” - Advocacia Geral da União. Depois, passou a impressão a Calero
que desejava preservá-lo no cargo e, mais tarde, perguntou a Calero como Geddel
poderia recorrer da decisão do mérito exarada pelo Ministro da Cultura.
Gustavo Rocha – Secretário de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, perguntou se Calero já havia enviado o processo à AGU, insistiu nessa proposta e, por fim, se apresentou, como autorizado pelo Presidente da República, a repetir, pela terceira vez, a pergunta, mesmo depois que Calero comunicou a Temer que não iria mais atuar no processo. Comunicou a Calero que ingressara com um recurso junto à Presidência do IPHAN para reformar a decisão do Ministro da Cultura.
Procuradoria e Procuradores do MinC – A
Procuradoria decidiu o recurso de Geddel pela redução do gabarito do prédio. Os
procuradores foram chamados à AGU, quando esta considerava que Calero lhe
enviara o processo, o que não ocorreu.
Nara de Deus – Chefe de Gabinete de
Temer, solidarizou-se, informalmente, com a postura legalista de Calero.
Carlos Henrique Sobral – Chefe de
Gabinete de Padilha, figurante sem relevância, que apenas interrogou Calero
sobre o prazo recursal que cabia a Geddel.
Grace Mendonça – Ministra-Chefe da AGU,
que não chegou a atuar no processo.
Michel Temer – Inicialmente,
tranqüilizou Calero, aconselhando-o a responder a Geddel que, por razões
técnicas, não foi possível atendê-lo. Mas, num seguindo encontro, disse a
Calero que a sua decisão estaria criando “dificuldades operacionais” em seu
Gabinete. Recomendou-lhe, então, que tentasse construir uma saída para que o
processo fosse encaminhado à AGU, porque a Ministra Grace Mendonça teria uma
solução. Em outra oportunidade, tentando aplacar a ansiedade, impaciência e a
intolerância de Calero quanto a pressões que estava sofrendo, justificou,
apascentando-o: “... a Política tinha dessas coisas, esse tipo de pressão”.
Calero sentiu-se “desapontado” (SIC) e depois recebeu os acautelamentos de
Temer como se este o tivesse “enquadrado” (SIC). Em minha opinião, pura
insegurança púbere e pretexto para deixar o cargo. No mesmo dia, no início da
noite, presencialmente, disse ao Presidente que “estava se demitindo”, no que o
Presidente tentou demovê-lo da atitude. No dia seguinte, 18 de novembro,
recebeu ligação de Calero dizendo que “entregaria o seu cargo”. Temer, mais uma
vez, lhe disse que não “via razões para isto”, mas Calero retrucou dizendo que
“as teria”. E tudo foi consumado. A cortina se fecha.
MEU JULGAMENTO: Não houve crime comum
ou crime de responsabilidade de Temer. O Presidente, apenas, tentou dirimir,
promover um entendimento entre dois de seus ministros, mesmo que o interesse de
uma das partes fosse privado, particular. O Presidente nada arbitrou, porque
nada falou, encaminhou ou decidiu no processo, inclusive sugeriu a Calero o
socorro da AGU, que é um órgão, não apenas de defesa de interesse da União, mas
de assessoramento e aconselhamento jurídico do Presidente (Decreto nº 7.392, de 13.12.2010).
COM A PALAVRA, A COMISSÃO DE ÉTICA PÚBLICA
DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, A POLÍCIA FEDERAL E
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
E, CLARO, O SEU COMENTÁRIO DE INTERNAUTA QUE
VISITA ESTE BLOG. SEU E-MAIL NÃO SERÁ PUBLICADO.